sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Parece

Parece até verdade quando fecho os olhos e sinto o teu peito espalhado nas minhas costas.
Parece real eu puxar a respiração e junto com o ar vir o cheiro do teu travesseiro que é o mesmo do teu cabelo lavado.
Quase me convence que o desconforto que sinto agora é o mesmo das pancadas do teu quadril nas minhas coxas,
a diferença é que este último é deliciosamente suportável.
Estar sozinha em casa só tem sido um agravante pra eu cultivar esse memorial de você, te recrio em tudo que eu faço e o peso que sinto nos ombros estaria explicado se o fantasma do que vivemos estivesse apoiado sobre eles.
Bem provável que esteja, ele está em toda parte.
Está sentado no seu lugar do sofá, enrolado na sua toalha e me olha com desespero.
Está no box do banheiro onde você gostava de desenhar a minha silhueta.
Tem regado as plantinhas moribundas do canteiro da varanda que só você regava.
Está tomando aos montes os suplementos que você esqueceu aqui.
Me acorda todos os dias na hora exata que seu despertador toca.
Ele veste suas roupas e constantemente coloca seu contato na tela do meu celular implorando que eu ligue.
Ligue pra dizer que Não, não tá tudo bem! quando você perguntar.
Ligue pra dizer que tá foda, que não estou acostumada com o fato de sermos apenas bons amigos e nunca vou me acostumar com isso. Que nossas conversas não cabem no padrão de conversas cordiais e que minhas pernas tem estremecido de frio quando é noite por não estarem sentindo os pelos das suas, que me reviro na cama madrugada adentro procurando a forma como meu corpo se encaixava perfeitamente no seu.
Ligue pra dizer que eu já fiz de tudo e não tem jeito que eu conheça que dê jeito nesse vazio. Que eu não lembro mais quem eu era antes de você chegar, nem como eu me divertia sozinha aqui em casa quando não tinha vontade nenhuma de sair no fim de semana.
Que eu não quero viver pra sempre na espera de te ver entrando por essa porta dizendo que não aguenta mais de saudades. E que me assusta não saber até quando durará essa expectativa brutal de regeneração, até quando vou ficar nessa, doendo, aflita; procurando, quase que aleatoriamente, mãos que sirvam para apagar as tuas digitais de mim, e corpos bem diferentes do seu para que eu prove pra mim mesmo que ainda consigo gostar de qualquer coisa que não me lembre você.
Digo não ao fantasma do que vivemos, e enquanto ele reclama, de novo fecho os olhos e sinto o teu peito espalhado nas minhas costas.
Parece até verdade. Parece real. Mas eu aqui, nem sei onde você está agora.

***



Nota: Nunca mais eu tinha escrito nada tão clichê. Tem gente que gosta. Eu sou suspeita a falar.